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Só existem dois vasos de cristal no mundo. Não existem mais exemplares.
São raros.
Transparentes e perfeitos.
Em algumas ocasiões o primeiro vaso se quebra.
Por acidente. Por descuido.
Por bobagem. Por ódio.
Raiva ou desespero.
Fica partido em milhões de pedaços.
Miúdos.
No chão a espera de serem recolhidos.
Quase sempre não são recolhidos. Passam o resto da vida espalhados no chão.
Cacos espalhados no chão.
Cortam pessoas que nada têm a ver com a história.
Correm para debaixo do tapete.
Viram farpas.
Infeccionam entre os dedos.
Até o corpo expulsá-los naturalmente.
Um belo dia você acorda - e isso não acontece na vida de todos - apenas na vida de alguns.
Porque fizeram por merecer.
Ou porque não fizeram nada.
Ou porque precisavam de alguma coisa.
Simplesmente acontece.
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E o vaso está lá. De volta sobre a mesa.
Lindo.
Limpo.
Mais transparente do que nunca.
Parece inacreditável. E é inacreditável.
Você chora de alegria. De esperança.
E aí se dá conta que ele não é o original. Não é o primeiro vaso.
E sim, a sua segunda versão. Aquela última versão.
A única. Depois dele não haverá mais vasos como este sobre a mesa.
Você vai ficar paralisado.
Por um instante o desespero vai tomar conta de você.
O medo irá tomar conta do seu corpo.
O que fazer para que um objeto tão importante não se quebre novamente?
Se guardar ele poderá quebrar.
Se deixar exposto ele poderá quebrar.
E ele não pode quebrar. Não haverá mais chances. Essa é a única oportunidade.
Provavelmente você irá perder boas noites de sono. Apenas pensando em como proteger o vaso das intempéries do mundo. Das suas intempéries.
E provavelmente vai descobrir que não há saída.
O vaso continuará sobre a mesa. Sendo admirado por todos e por tudo. Correndo os mesmos riscos. A solução não está em escondê-lo do mundo. Em imortalizá-lo numa redoma de vidro. Lembre-se: por mais parecido que possa ser... este é outro vaso.
E você não tem controle sobre a sua resistência. Assim como não tinha sobre sua primeira versão. Você vai perceber, com o tempo, que a única coisa a fazer é admirá-lo. Agradecer ao universo pela oportunidade de ter algo tão bonito mais uma vez.
E aos poucos descobrir os seus limites.
O seu...
O do vaso...
A distância da mesa...
Quantas cadeiras cabem ao seu redor.
Que tipo de flores colocar.
Se é que este é um vaso para flores.
Um comentário:
importante essa última fala..."se é que esse é um vaso pra flores"...pois sabemos que alguns vasos além de flores podem estar repletos de amores, dores, músicas, cores e um infinito de coisas mais! Admiremos pois e chega de esconder e resguardar os vasos lindos desse mundo! beijo grande...
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